sábado, 1 de fevereiro de 2014

O que fica de Amor à Vida

Desde que Amor à Vida estreou, e principalmente ao longo de seus meses, eu me questionava por que a direção da Globo resolvera alterar o título original da novela. Afinal, Em Nome do Pai se encaixava perfeitamente bem nas atrocidades de Félix e nos seus atritos com César. Mas aí o capítulo final de ontem calou todas as minhas indagações. Eu já assisti a diversos finais de novelas, mas não me recordo de nenhum que tenha me emocionado tanto. Walcyr voou alto na sua estreia no horário nobre da Globo, desde as diversas reviravoltas de seus personagens ao longo dos 221 capítulos de sua trama, até selar o primeiro beijo gay das telenovelas globais.

Sem dúvida alguma, o grande protagonista de Amor à Vida foi Félix. De vilão a mocinho querido dos telespectadores, a sua redenção foi uma das decisões mais bem acertadas do autor. Já havia lido por aí que Walcyr tinha estragado Félix, desfazendo um dos melhores vilões da tevê atualmente. Não vejo assim. Félix foi realmente apresentado como o grande monstro da trama no primeiro capítulo, cometeu diversos crimes, foi cruel, insensível e prejudicou várias pessoas, porém, ele foi à sarjeta bem antes do esperado. Aliás, uma das maiores características da novela foi justamente essa: não prender trama. O reencontro de Paloma com sua filha, que poderia ter sido o gancho de muitos autores para o capítulo final, Walcyr já desvendou bem antes do capítulo 30. E bem antes também desmascarou Félix para a irmã.

O muro de orgulho e prepotência foi aos poucos se quebrando e cedendo lugar à compreensão, à tolerância e à humildade nos braços acolhedores de Márcia, a grande Tetê Para-choque e Para-lama, outra personagem, que apesar de alguns exageros, segurou a novela com honra. Mas os desmandos de Félix tinham uma origem: sua relação mal resolvida com o pai, que embora não justificasse muito suas atitudes, mostrava o que a falta de amor e de compreensão é capaz de fazer. A rejeição de César, a vida inteira, pelo filho - devido a sua homossexualidade -, gerou ódio e transformou-se em ação, ação destrutiva, Félix virou uma fruta podre, cujo toque espalhava veneno e destruição pelo caminho de todos.

Ah, mas aí entrou o amor, e só o amor e o perdão para mudar tudo. O amor de Márcia - sua babá perdida -, o amor de Niko - o amigo conquistado -, o perdão e o amor de Pilar e até de Paloma. Félix se sentiu acolhido para recomeçar, ter sua nova chance, e diante de tanta demonstração de afeto, percebeu que era possível viver no bem. E ninguém precisa ser condenado à cruz quando está disposto a se modificar e refazer seus atos pelo amor. Aos poucos, a figura do Félix de antes foi desaparecendo e o vilão se transformou realmente no protagonista da história, suplantando Paloma e Bruno, e ganhando até par romântico com direito a torcida do público.

O capítulo final de Amor à Vida foi tão intenso que fica difícil descrever tudo. Algumas passagens, todavia, merecem destaque. A revelação de Pilar sobre sua culpa na morte da mãe de Aline; a fuga de Edith com Wagner; o perdão de Paulinha a Félix; a dança sensual de Márcia, vestida de chacrete, para Atílio/Gentil; Amarylis sendo desmascarada por Niko; a visita de Paulinha a Ninho na prisão e o remorso dele pelos seus atos; a notícia de Jonathan de que passou no vestibular de arquitetura e a comemoração de Félix; Valdirene quase parindo no casamento da mãe; o destino de Aline; e claro, o desfecho de César, que se viu inválido, traído, humilhado, sem perspectiva de vida, e foi encontrar, justamente nos braços do filho rejeitado, a ajuda e o acolhimento de que tanto necessitava no momento. Tão verdadeiro, tão humano. E aí mais uma vez o amor agiu e levou todo mundo às lágrimas. Numa fotografia deslumbrante, Félix revela seu amor a César, que reconhece a dedicação do filho e o aceita finalmente com um “eu também te amo”, que o ex-vilão tanto desejou escutar em toda sua vida. A vitória do amor sobre o preconceito e a intolerância. Com tudo isso, o tão polêmico beijo entre Félix e Niko, numa cena de pura delicadeza e cumplicidade, depois daquele reconhecer que o chefe de cozinha mudou sua vida, foi apenas a cereja do bolo.

Já critiquei muito os enredos pastelões de Walcyr Carrasco, seus diálogos óbvios, seu humor escrachado, mas hoje ele ganhou um grande ponto comigo. Em tempos em que se vê tanta desordem no mundo, tanta intolerância, violência, injustiça e incompreensão, a lição de amor, já difundida lá atrás na canção dos Beatles, veio brotar onde menos se esperava. Walcyr provou que o título da novela faria jus à sua história, e Amor à Vida, apesar de ficção, foi um grande exemplo para a humanidade de que o nosso planeta ainda tem chance, de que o amor ainda pode transformar esse mundo para melhor. 

9 comentários:

  1. Concordo em gênero, número e grau ;)

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  2. Wow! Voltou a escrever. :D

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  3. O amor acima de tudo!

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  4. Tudo por amor. Muito lindo, gostei demais! Pai e filho se amando... lindo! Só o amor!

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  5. Tava com saudades dos teus textos Samuel. Bjo!

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  6. Texto excelente! Tudo o que penso também.

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  7. Eu não vi nada da novela, mas deu vontade de ver depois de sua crítica.

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  8. Saudades daqui... Um cantinho de revelações e sonhos...

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