terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

O espelho de alguém

Quando eu era mais novo, fã de Sandy e Junior, naturalmente, queria ser como Junior. Deixava o cabelo igual, usava roupas semelhantes, tentava reproduzir seu jeito de se portar, buscando me espelhar ao máximo, naquela figura que para mim era um ícone, um modelo a ser seguido. Mas mesmo com todos os esforços, era impossível me igualar por completo. O cabelo não tinha o mesmo caimento, o pescoço dele parecia ser mais comprido, o sorriso era mais espontâneo. Contudo, a diferença mais crucial estava nos ombros. Os meus sempre foram muito largos, ombros de nadador, como me diziam, mesmo sem praticar o esporte. Junior, por sua vez, tinha a espádua curta, descendo numa nítida inclinação a partir do pescoço. Aquilo era realmente uma diferença anatômica que eu não poderia corrigir. Incontáveis vezes sonhei ter seus ombros curtinhos para que as roupas ganhassem em mim o mesmo contorno que ganhavam nele. Mas nem tudo poderia ser perfeito.

Certa vez, durante uma entrevista no programa da Xuxa, Junior foi questionado por ela, sobre algum possível defeito que gostaria de corrigir em seu corpo. E inesperada foi a minha reação quando descobri que Junior desejava ter ombros mais largos. Era isso mesmo! Aquilo que para mim sempre foi um empecilho para me “igualar” a ele, era exatamente o que Junior gostaria de ter. Foi só aí que me dei conta da ideia absurda que estava alimentando. A perfeição que eu buscava não existe, porque nunca ninguém será unanimemente perfeito. A anatomia de Junior era a ideal aos meus olhos, porque era a que estava nele, a que fazia parte do ídolo que idolatrava. Mas não tinha me ligado ainda que ele também poderia ter seu próprio ícone a se espelhar. Comecei então a dar valor aos meus ombros, afinal, não eram os de Junior, mas eram os que ele desejaria ter, e sabe lá quem mais.

Esse episódio me voltou à mente essa semana durante uma reunião no centro espírita que frequento. Sempre ao chegar, recebemos um panfleto com algumas frases, geralmente extraídas do livro Vida Feliz, de Divaldo Pereira Franco, pelo espírito Joanna de Ângelis. E nesse dia, uma das frases dizia o seguinte: “mesmo que não saibas, és exemplo para alguém. Sempre existem pessoas que estão observando os teus atos, mesmo os equivocados, e se afinam com eles. Desse modo, és responsável, não só pelo que realizes, como também, pelo que as tuas ideias e atitudes inspirem a outros”. Nunca tinha me questionado ser exemplo para alguém. Eu que sempre busco o espelho do outro. Quem iria querer me ter como modelo para qualquer coisa? Nunca faço nada de interessante. Sou um tipo tão normal que beira a anormalidade. Só um desavisado poderia enxergar algo útil em mim. Mas... e se existe mesmo esse alguém? Se realmente estou servindo de base para outra pessoa traçar suas atitudes e comportamentos? Há um perigo então aqui.

São tantos rostos cruzando nosso caminho diariamente. Tantos passos apressados em ruas que nunca pisamos, pessoas que jamais tornaremos a rever. Será que durante uma travessia numa calçada, não estamos sendo observados e inspirando alguém a nos copiar? Um simples gesto, um bater de cabelo, o andar, um sorriso. Qualquer detalhe pode despertar o interesse do outro. Afinal, involuntariamente, somos a perfeição de alguém. Nossa vida pode realmente influenciar as decisões do próximo, e ainda atrair semelhantes das variadas esferas. Encosto, arrimo, obsessor, estão todos ligados a quem de alguma forma facilitou o acesso à pessoa. Quem sabe não temos o sorriso, a roupa, o cabelo ou o ombro perfeito para algum desencarnado? Já li um caso de um espírito que se ligou a uma atriz famosa para garantir que ela não deixasse de interpretar determinado papel. Provavelmente, ele estava mais envolvido com a vida da personagem do que com a da atriz.

E exatamente como Junior não fazia ideia da fixação que eu tinha em me assemelhar a ele, essa atriz não poderia imaginar os transtornos que sua personagem causara nesse fã. É correto então atribuir aos dois a responsabilidade dos atos cometidos pelos fãs? Tenho minhas dúvidas. Não havia uma intenção direta dos artistas para os fãs tomarem determinadas atitudes. Por outro lado, independente da intenção, foi através do contato indireto entre eles que os fãs agiram. Há sim, alguma responsabilidade, com certeza, em todos os nossos atos, mas não há como saber de onde pode surgir a próxima identificação, que tipo de pensamento ou atitude pode desencadear essa afinação. Mesmo os mais singelos comportamentos, podem despertar bizarras situações. É imprevisível! Por isso, o importante mesmo é saber que observamos e somos observados todos os dias, por quem menos imaginamos. E não podemos esquecer nunca, que enquanto buscamos um espelho no outro, também estamos sendo o espelho de alguém.

4 comentários:

  1. eu também sempre me indentificava com atriz Glo´ria Pires sempre queria ser parecida com ela, lenbro que quando cortei meu cabelo pela primeira vez, tava passando a novela Água viva e lea fazia um papel que o cabelo dela era curto como meu ai algumas pessoas que asistia a novela dizia voc~e parece a sandrainha de àgua viva e eu achava otimo pois queria ser parecida com ela, mas emfim e assim agente sempre que imitar alguém quer ser parecida com algúem, mas é a vida, adorei o texto xero.

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  2. fã do Junior?
    gente, era o único então
    hehehe

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  3. Gostei muito da reflexão que vc faz neste texto.
    Eu miro exemplos, imagino perfeições muitas vezes ao dia, quase sempre em olhares que nunca cruzarão os meus.
    E nunca tinha pensado nessa possibilidade de ser também obervado assim por alguém...
    Muito bom.
    Pense também na sua autoimagem!

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  4. nobody is perfect.
    no body is perfect.

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