quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Palpite

Descobri essa semana através da mídia que o autor de telenovelas Manoel Carlos irá se despedir da teledramaturgia em 2014, e que a atriz Lilia Cabral será sua última Helena. Desde que Mulheres Apaixonadas foi ao ar em 2003 havia o murmuro de que Maneco só faria mais uma única novela. Aí veio Páginas da Vida, a minissérie Maysa e Viver a Vida. Contudo, agora parece que não tem volta. E como ficam os telespectadores sem suas Helenas, sem o Leblon, sem Tom Jobim, sem o realismo cotidiano que só Maneco consegue traduzir em seus folhetins? Como fã incondicional do seu estilo de escrever, desde que vi a poesia traduzida em ficção na consagrada Por Amor de 1997, eu esqueço às vezes, que os autores de novelas também se aposentam, e que Maneco já terá 81 anos quando sua última obra for ao ar em 2014.

Ainda era um guri de 6 anos quando acompanhei pela primeira vez, uma novela de Manoel Carlos, Felicidade. Quatro anos depois, assistia História de Amor. Mas quero frisar aqui um marco em sua carreira de novelista, que me fez aos 12 anos me render por completo ao seu trabalho. "Do que você seria capaz por amor?" Esse era o teaser que ia ao ar com os atores da novela respondendo o que fariam por amor, antes mesmo das primeiras chamadas de Por Amor ir ao ar. Era uma história densa, profunda, mas que Maneco soube jogar com sutileza e poesia, tocando fundo na sensibilidade humana. Que mãe não sacrificaria sua felicidade em nome da felicidade do filho? Como julgar a atitude de Helena? Egoísta? Fraca? Superprotetora? Talvez todos esses adjetivos. Mas humana. Fica claro desde o início da trama que Helena criou errado sua filha Maria Eduarda, a tornando frágil, insegura, mimada e orgulhosa. E nem a cumplicidade de amigas que conservaram durante a vida conseguiu mudar esse fato. Gabriela Duarte conseguiu criar uma personagem tão autêntica que por anos ficou estigmatizada como a enjoada de Por Amor e gerou revolta em muitos telespectadores que criaram um site exigindo que ela morresse na trama.

Se por um lado tínhamos o conflito de Helena e sua filha, por outro tínhamos Suzana Vieira dando vida a uma de suas mais bem sucedidas personagens, Branca Letícia. Uma mulher amargurada no casamento, mãe de três filhos, mas que só dedicava amor a um, e ainda mantinha uma paixão escancarada pelo viúvo Atílio, Antônio Fagundes. A novela ganhava força com outros núcleos pesados como a família de Laura Trajano, a ex-namorada do filho mais velho de Branca, Marcelo, apaixonada até o fim da trama por ele, e que infernizava o casamento de Maria Eduarda. O núcleo de Orestes, o ex-marido alcoólatra de Helena, que buscava na sua filha de 6 anos do segundo casamento a força para se livrar do vício. E claro, o romance mais repleto de química da teledramaturgia brasileira até então: Milena e Nando. Carolina Ferraz esbanjou sensualidade, delicadeza e irreverência na sua personagem, e Eduardo Moscovis se encaixou direitinho entre a leveza e a objetividade de Milena. Sem falar que a trilha sonora dos dois, tanto Palpite de Vanessa Rangel, como Só Você de Fábio Jr, foram um dos maiores sucessos do ano. Assim como com a canção Per Amore de Zizi Possi marcou a trama e entrou na memória afetiva de cada telespectador.

Foi realmente uma trama memorável. E hoje, quase 13 anos após sua exibição, e coincidentemente no mesmo período em que era reexibida pelo canal Viva, eu consegui conhecer o local onde foi gravada sua última cena no Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Helena, Atílio, Maria Eduarda, Marcelo e Marcelinho caminham em harmonia enquanto redescobrem o verdadeiro valor da vida, ou aprendem a amar, como Atílio enfatiza para Helena quando ela confessa que trocou as crianças na maternidade: "você não sabe amar... mas pode aprender". Bom, eu tenho um palpite, a teledramaturgia brasileira não será jamais a mesma depois que Manoel Carlos deixar definitivamente de assinar suas novelas. Sorte do ator que pôde um dia ter feito parte do elenco de alguma obra de Maneco. Meu amigo Júlio diz que eu sou rasgado demais quando teço elogios a Manoel Carlos, mas desculpa, Júlio, quando alguém consegue transmitir princípios de integridade familiar, numa verdadeira crônica do cotidiano, com suas harmonias e dissonâncias, usando sensibilidade e acima de tudo humanidade, eu não posso falar menos. É só aguardar ansioso sua próxima trama e lamentar ser a última.

6 comentários:

  1. concordo plenamente contigo, maneco e um otimo escritor como ele nao tem iguel, adoro a dramatogia dele, e perfeita e a realidade entrando em nossas casas, que pena que ele vai nos deixar, faz fazer sua ultima novela em 2014, mas e a vida, pode aparecer um dia vc que escreve muito bem suas cronicas.

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  2. Samuca, você vai ficar nos devendo o roteiro de uma novela.Sei através das suas crônicas que você tem capacidade para fazer. Afinal você não é só um fã de Maneco, é um discípulo também (risos) Estava assistindo o final de POr Amor reprizada no canal viva e lembrei de você. Fiquei vendo Helena, Atílio e a criança caminhando de mãos dadas, indo de encontro ao amor e pensei que talvez você pudesse dar continuidade e vida para Atílio e Helena se materializarem através dos filhos que ele não sabia, tendo-os.Fiquei imaginando no que faríamos por amor, aonde iríamos por amor. Razãoxemoção. Eis a questão. Espero ver na abertura de uma novela global. Escrita por por: Samuel Dias. Maktub!!!!!!!!!!!

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  3. Ah, Lu, obrigado pelos elogios. Escrever novelas sempre foi um desejo meu. Na época do cursinho em Natal, meus colegas me chamavam de Samuel Carlos pela afinidade que eu tinha com Maneco, que na época escrevia Mulheres Apaixonadas.
    Bom, com os anos esse desejo foi perdendo força, mas a vida dá voltas e nos move constantemente.
    Quem sabe um dia, né?

    Forte abraço!!

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  4. Quanto ao livro, o Fruto do Ventre, você irá amar é muito interessante. Prende a nossa atenção até o final. Eu ficava querendo terminar logo para saber o que ia acontecer. Tenho mania de começar a ler revista pelo final. pego já viro a capa. Só que com os livros não dá.E você merece os elogios.

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  5. Sam,seu post chegou a ser poético.Cada frase que eu lia,vinha as imagens a minha cabeça.Parabéns!

    Adoro as novelas do Maneco.Hoje em dia,vejo menos por causa de falta de tempo.Acompanhei pouco a última dele:Viver a Vida.

    Continue escrevendo seus belos posts que agradeceremos.
    Abraços.

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  6. Nossa, tbm adoro Manoel Carlos! que triste que ele irá se aposentar...hehe. A primeira novela q assisti dele foi Historia de amor. Eu gostava, mas nem tanto. Mas quando veio Por amor, nossa! eu amei! era criança na época e chorei no ultimo capitulo..hahah...nao queria que acabasse!Ah e adoro a musica Palpite e per amore!Assisti a novela quando passou, depois vi no vale a pena ver de novo e to louca pra ver de novo...pena que nao tenho o canal viva...
    Adorei o texto!!

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