segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Yesterday and today

O que faz uma banda permanecer viva quarenta anos após o seu término?  Quais critérios definem o sucesso de um grupo de rock? A música? Os fãs? Os cantores? Os compositores? Qual o ingrediente utilizado por John, Paul, George e Ringo nas suas canções, capaz de continuar conquistando novos admiradores a cada ano? Acho que não seria capaz de resolver tal questão. Talvez suas batidas She Loves You, From me To You, Can’t Buy me Love, ou suas baladas If I Fell, In My Life, Something, talvez o estilo psicodélico, as inovações em Revolver, Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band, os filmes, a Índia, as drogas. É muita vida para uma década apenas. O detalhe curioso nos shows de Paul McCartney no Brasil foi a gigantesca multidão que esgotou ingressos poucas horas depois de postos à venda. Uma multidão que não acompanhou a febre da beatlemania, que não viu os garotos inebriados com o sucesso se transformarem em ícones, não presenciou o crescimento, as desavenças e até o rompimento em estilo Abbey Road, mas seguiu o cantor em todas as suas canções ao delírio.

Não sei desde quando, mas em algum momento da minha infância, eu tomei conhecimento de que existiu uma banda chamada The Beatles que fez muito sucesso no passado e de que todos falavam extasiados. Contudo, era algo distante de mim, uma realidade para os que viveram duas décadas antes de eu nascer. Cheguei a descobrir que havia um John Lennon, que parecia ter sido o cabeça do grupo e que havia feito muito sucesso também após o fim da banda, principalmente com uma música que todos aclamavam chamada Imagine, mas que ele havia sido assassinado. Sabia que outro grande cabeça chamado Paul McCartney ainda estava vivo, mas desconhecia alguma música solo de referência. Os demais não sabia sequer o nome. Bem, também por algum motivo que eu desconheço, sempre mantive uma ligação de encanto e nostalgia por músicas dos anos 60, 70 e 80. Gostava do ritmo, das lembranças que eu nunca tive e que elas me remetiam, e muitas escutava nas ruas, nos sons altos dos carros insistentes em bares até tarde da noite.

Havia algum fascínio na música Feche os Olhos de um tal de Renato e Seus Blue Caps, que me envolvia, apesar de minha mãe dizer que a música era antiga e brega. Tinha outra também chamada Menina Linda que eu me fissurava, mas não tinha conhecimento do nome da música, do cantor e muito menos do compositor. Achava a melodia de outra incrível, mas muita gente gravava e eu cheguei a pensar que a música não tinha dono. Aos 15 anos fui morar na casa da minha tia pra estudar e descobri que o marido dela tinha um cd duplo do famoso grupo The Beatles, intitulado Anthology 3. Deduzi que deveria haver o 1 e o 2. Era música pra não acabar mais. Minha prima só gostava de uma canção e vez por outra colocava pra tocar, era Let it be. Soava interessante. Mas eu queria ouvir mesmo era Imagine que todos diziam ser perfeita, só que era da carreira solo de John Lennon. Ah, tinha outra bem conhecida desse grupo, Yesterday, mas não constava no cd da casa da minha tia.

Finalmente pude escutar Imagine completa quando Paulo Ricardo regravou e eu comprei o cd. Não entendia o inglês, mas a mensagem parecia ser bonita. No mesmo ano, escutei uma versão, agora em espanhol, da música que eu gostava e que todos regravavam. Chamava-se Mi Grand Amor Le Di, de José Alberto El Canário, título original: And I Love Her, composição: Lennon/McCartney. Ah, achava que eles só cantavam rock pesado e musiquinhas broncas. Depois escuto uma Sgt. Peppers na voz de Cássia Eller e uma Here, There and Everywhere de Rita Lee, de autoria dos mesmos. Mas o grande insight só aconteceu sete anos depois, no último ano da faculdade, na cadeira de cinema, quando o abençoado e beatlemaníaco Rômulo Azevedo me apresentou definitivamente a John Lennon, Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr no auge de uma loucura que teve início na Inglaterra dos anos 60 conhecida como beatlemania, retratada no filme A Hard Days Night pelos próprios rebentos.

A partir daí foi um Love me Do, Please Please me, Twist and Shout, All My Loving, I Should Have Known Better, I Want to Hold Your Hand, Ticket to Ride, Help, Penny Lane, Day Tripper, Eleanor Rigby, Hey Jude, All You Need Is Love, Yellow Submarine, Paperback Writer, Revolution, Across the Universe, Strawberry Fields Forever, A Day in the Life, Lucy in the Sky with Diamonds, Ob La Di Ob La Da, Dear Prudence, Golden Slumbers, Come Together, Here Comes the Sun, Get Back. Um mergulho cada dia mais intenso em busca de “novas” canções, “novas” melodias. De repente me vi revivendo uma época que nunca vivi. Conheci Liverpool, The Quarrymen, o clube Caverna, Hamburgo, Pete Best, Stuart Sutcliffe, Brian Epstein, George Martin, a gritaria nas ruas, a recepção em Nova York, os cinemas de A Hard Days Night e Help, o título do MBE, o LSD, o Shea Stadium, o sargento Pepper, Maharishi Yogi e a meditação transcendental, Yoko Ono, o terraço da Apple, a faixa da Abbey Road, o acervo do Beatles Anthology. E quanto mais eu pudesse penetrar. 

Somente uma banda capaz de conquistar uma multidão de novos fãs 40 anos após deixar de existir, pode se considerar consagrada mundialmente. O poder e o alcance dos Beatles ultrapassaram não só a fronteira da Grã-Bretanha, mas a do tempo, e continuam influenciando gerações, transformando comportamentos, revirando as cabeças de jovens, adultos e deixando um rastro de obsessão aonde chegam. Paul McCartney e Ringo Starr hoje são relatos vivos de uma página da História do planeta, tipo como se Colombo, Napoleão, Cleópatra ou Hitler estivessem ainda aqui. A energia emanada de suas canções chegou até mim inconscientemente desde muito cedo, já era um fã dos Beatles em estado latente, e quando vislumbrei diante de mim tudo o que buscava, foi como um flash de memória perdida ressurgindo. Ainda engatinho pelo universo gigantesco de composições, bastidores e curiosidades do quarteto, mas ando absorvendo sua essência tão forte quanto a inalada de John em Girl. E sei que as partículas da explosão cósmica The Beatles continuam chegando a galáxias cada vez mais anos luz de nós, yesterday and today.

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