quinta-feira, 1 de maio de 2008

E Lá Vem o Trem...

Mais um novelo vai começar a se desmanchar a partir de segunda-feira na Rede Globo. Dessa vez trata-se de Ciranda de Pedra, de outro senil da teledramaturgia brasileira, Alcides Nogueira. A novela vem substituir a atual Desejo Proibido de Walter Negrão. Baseada na obra de Lygia Fagundes Telles, as chamadas de Ciranda de Pedra tentam mostrar que vem mais uma novidade no ar. Ou seja, Força de um Desejo parte 12. Desde 1999 quando a Globo descobriu que voltar a produzir novelas de época no horário das 18h era um bom negócio, ela vem investindo maciçamente.

Só para recapitular. Desde Força de um Desejo até agora foram 11 novelas de época que se alternaram quase que seguidamente no horário. Na lista temos Esplendor, O Cravo e a Rosa, A Padroeira, Chocolate com Pimenta, Cabocla, Alma Gêmea, Sinhá Moça, O Profeta, Eterna Magia e Desejo Proibido salvo algumas exceções como Estrela-Guia, Coração de Estudante, Sabor da Paixão, Agora é Que São Elas e Como Uma Onda. Agora vem mais outro “trunfo” da emissora. Uma estratégia que já vem sendo utilizada desde 2004 com Cabocla, o remake de tramas de épocas. Ah, mas Ciranda de Pedra não é um remake, é só uma “nova” adaptação do livro homônimo.

Não sou contra as novelas de época, pelo contrário, sou muito fã de obras que se passam em outros séculos, acredito que elas servem de resgate histórico e enriquecem o nosso conhecimento a respeito de costumes, hábitos e comportamentos. No entanto, não é isso que eu tenho encontrado nos folhetins ditos de época da Rede Globo. Só pra começar, todas as mocinhas que se apaixonam nas histórias são verdadeiras Mias Coluccis. Enfrentam os pais, saem de casa, moram sozinhas, se entregam aos amores. Não desmerecendo as jovens daquelas épocas, mas os pais exerciam uma pressão muito forte nas famílias para os filhos serem tão rebeldes como os que são representados. Tem dias que até parece um capítulo de Páginas da Vida ou da maçante Rebelde.

O encanto que dominava as verdadeiras novelas de época se perdeu no espaço. Bons tempos aqueles em que podíamos mergulhar na São Paulo de 30 com a simplória, porém rica Éramos Seis, podíamos vivenciar a força das espadas e a magia dos bruxos na França do século XVIII em Que Rei Sou Eu?, ou mesmo a escravatura e a vida pudica dos arraiais em Xica da Silva. Quando novela de época se tornou puramente negócio, sua essência desapareceu.

E agora vem o Vale a Pena Ver de Novo reprisando a chata e aguada Cabocla que mal disse fim. Se é pra repetir novelas das 6 que não fazem jus ao título do programa, é preferível reprisar clássicos como Mulheres de Areia, Barriga de Aluguel, Felicidade ou até mesmo sucessos recentes como Estrela-Guia e Esplendor. Coração de Estudante foi um segundo de lucidez de algum gênio do Projac.

O que falta de verdade para tornar novela de época, realmente novela de época é criatividade. E não acredito que seja possível a Benedito Ruy Barbosa, Alcides Nogueira, Walcyr Carrasco e tantos outros, buscar novidades a essa altura do campeonato. Só Walcyr Carrasco que escreveu a célebre Xica da Silva na extinta Manchete, se especializou em dramas à la Maria del Barrio na Globo, e ainda consegue gabarito quando escreves absurdos que distorcem a filosofia espírita como Alma Gêmea.

Quando Desejo Proibido ia começar até me animei um pouco. Parecia ser uma história diferente com um autor que não tem muitas referências em tramas antigas. Mas bastou chegar na cena do trem no primeiro capítulo, quando Laurinha conhece o padre Miguel que já me remeti a Sinhá Moça, Cabocla, Chocolate com Pimenta e tantas outras. É incrível como o mesmo ganha sentido de novo, quando é mostrado numa nova roupagem.

Admiro muito os grandes autores como Benedito Ruy Barbosa, Manoel Carlos, Glória Perez, Gilberto Braga, Sílvio de Abreu, Aguinaldo Silva, o próprio Alcides Nogueira, mas eles já deram sua cota de contribuição para a teledramaturgia brasileira. É preciso surgir uma nova fase com nomes que marquem toda uma nova geração. O grupinho de autores da Globo precisa urgentemente passar por uma faxina. Abrir as portas para as novas mentes, como já vem sendo feito com João Emanuel Carneiro, que inovou em Da Cor Do Pecado de forma simples e já conseguiu espaço no horário nobre. Espero que não seja o mesmo resultado da sua segunda e inóspita investida Cobras & Lagartos.

É uma tarefa difícil e nem todos os novatos conseguem se dar bem. A estreante Andréa Maltarolli tenta fazer algo diferente mexendo pra aqui e pra lá na insossa Beleza Pura, que de beleza não tem nada. O jeito, enquanto a galera não muda, é continuar não esperando muito do que vai começar. Contudo, acreditando que Alcides Nogueira foi autor de sucessos como as minisséries JK e Um Só Coração ao lado de Maria Adelaide Amaral, é possível que saia alguma coisa decente a partir de segunda-feira. É só esperar e conferir a estréia de Ciranda de Pedra. Mas se eu encontrar logo no primeiro capítulo algum futuro casal que se conhecem numa viagem de trem, desligo a TV na mesma hora.

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